Já, no outro Inverno, tinha passado um mau bocado.
As geadas e as neves apanharam-no desprevenido. E foi-lhe muito difícil fazer nascer umas tímidas folhas, para saudar o sol quente do Verão.
As geadas e as neves apanharam-no desprevenido. E foi-lhe muito difícil fazer nascer umas tímidas folhas, para saudar o sol quente do Verão.
Se a Primavera tem vindo boa, outro galo cantaria, mas assim, sem tempo
para recuperar a sua antiga força, viu-se definhar, e aos últimos ventos do
Outono, Zás... uma rajada mais forte... e foi vê-lo tombar.
Primeiro, encostou-se sobre os irmãos, pendeu, balançou, rodopiou sobre
si mesmo e despenhou-se, vindo estatelar-se em ruído num chão das folhas
velhas.
No bosque é assim. Não foi o primeiro, nem será o último dos ramos a
desprender-se da copa, para se juntar ao tapete castanho de folhas que cobre o
chão.
Como poderiam nascer os cogumelos?
Não se sentiu muito confortável nesta posição.
Assim tombado, não tinha as vistas de antigamente e sentia que, do seu
corpo se ia soltando a casca, aos poucos e poucos, retirada por uma ou outra
formiga mais atrevida, por uma ou outra larva a crescer nas suas pregas. Sentia
desprenderem-se as pontas dos seus guiços mais finos e, com elas, o que lhe
restava de vida.
Não tinha as vistas nem a companhia...
É que, com os outros, lá no cimo do carvalho, sempre ia sussurrando ao
ritmo das brisas e ia conspirando com os pássaros que nele poisavam. Comigo
mesmo, tinha tido longas conversas de lusco-fusco, que um dia vos hei-de
contar.
Sentiu-se estremecer, estalou a sua madeira, viu-se arrancado ao sossego
e à terra e arrastado pela folhagem.
Só passado o primeiro espanto percebeu que era arrastado por um garoto,
um garoto, que não podendo com o seu peso, fazia um grande esforço por o puxar.
Apetecia-lhe gritar – Ei! Moço! Vê lá o que fazes!
Mas de que serviria. As pessoas não entendem as palavras dos ramos...nem
das árvores!
E assim deixou-se arrastar.
De momento a momento o garoto parava, esfregava as mãos uma na outra,
juntava mais um raminho ao braçado junto ao peito e recomeçava a caminhada e o
arrasto do ramo grande.
Anoitecia e o céu cinzento começara a desprender-se das alturas, desfazendo-se
em pedacinhos de branco que poisavam no chão e na camisola do menino, a tudo
dando um aspecto diferente, alvo e frio.
O garoto tremia, acelerava o passo, parava e andava, esfregando as mãos a
cada paragem, até parar à frente de uma casa no limite do bosque.
Largando os ramos, entrou a gritar – Mãe, mãe... esta noite não vamos ter
frio!
Voltou a sair, transportou os ramos para dentro e acomodou-os no centro
de uma sala escura e húmida.
Juntou os ramos bem juntinhos e fez deles uma fogueira.
Tenho a certeza que o ramo grande chorou, (que naquela noite vi lágrimas
brilhantes a sair da telha vã daquela casa... e que não se confundiam com os
flocos de neve!) e não foi por ter ardido!
Chorou porque, nessa noite, aquela casa não foi fria, nem húmida, nem
escura. E porque o menino se sentou à sua beira e disse para a sua mãe:
– Assim já parece Noite de Natal.
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